
Insistimos: a abertura do Museu Berardo em Lisboa é um acontecimento
histórico para Portugal.
O museu vem preencher um vazio numa área museológica muito carenciada em
Lisboa e vem colocar o país no mapa artístico internacional, dando também
mais visibilidade a artistas portugueses que passam a poder ser vistos no contexto
dos grandes criadores e dos principais movimentos artísticos internacionais desde
início do séc. XX. Além disso, o museu vem potenciar outros museus já existentes
no país, como o Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian e o Museu do
Chiado, ambos em Lisboa, ou o Museu de Serralves, no Porto, com os quais se
espera venham a ser estabelecidas parcerias e projectos comuns.
No campo das parcerias, imagine-se o que seria uma grande exposição dedicada
à Pop Art, que reunisse o excelente núcleo da Pop britânica do CAM/FCG e o
imprescindível núcleo da Pop americana do MCB/CCB, ao qual se juntariam obras
de artistas portugueses ligados à Pop. E imagine-se que essa exposição, depois da
sua apresentação em Portugal, viesse a ter circulação internacional.
É bizarro o modo como a abertura do Museu Berardo tem sido tratada na maioria
dos orgãos de informação e também na blogosfera. Quase toda a matéria noticiosa
e a opinião publicada sobre o assunto incide nas polémicas em torno da personalidade
do coleccionador, ou em questões de ordem financeira relativas aos custos da
manutenção do museu.
Parece que há uma preocupação generalizada entre jornalistas e comentadores de
que Joe Berardo possa ampliar a sua fortuna à custa do Estado português, sendo o
governo acusado por alguns de não acautelar o interesse público.
Subestimam-se deste modo, quer os direitos do coleccionador a usufruir dos bens
por si adquiridos, quer a inteligência da sua estratégia empresarial (que não parece
restringir-se ao investimento financeiro). Subestimam-se ainda as responsabilidades
do Estado no desenvolvimento de políticas culturais de alcance internacional.
E, sobretudo, subestimam-se a relevância artística da colecção e a importância que
o museu terá para o país, quer no plano interno quer externo . É preciso perceber
que há uma geração de jovens portugueses que vai passar a beneficiar do contacto
directo com a história das vanguardas artísticas desde início do séc. XX até ao
presente.
Joe Berardo foi o primeiro português a ousar investir uma fortuna considerável na
criação de uma colecção de contornos internacionais. Ele terá compreendido que as
insuficientes políticas estatais e empresariais neste sector, lhe abriam caminhos de
afirmação a todos os níveis. Berardo, ao contrário da maioria dos empresários
portugueses, é um exemplo de quem, tendo partido do "nada", soube dar um destino
nobre à sua fortuna.
Só podemos concluir, por muito que custe aos nossos mesquinhos media e às nossas
(ultra)periféricas elites, que faltam mais berardos destes em Portugal.
[Adenda]
Alexandre Pomar sugere que seja criado um fundo de donativos destinado
a novas aquisições do Museu Berardo. Uma boa ideia, que se pode ler aqui.
[Adenda 2 > 30.6.2007]
Não há qualquer referência ao novo Museu Colecção Berardo no site do CCB.
[Adenda 3]
Sobre o lamentável conflito Mega/Berardo veja-se o que escreve Daniel Oliveira,
Sangue azul e massa cinzenta. É certo qua as afirmações de Berardo foram
infelizes, fruto talvez de ter o "saco cheio", e é pena que ele não se tivesse ficado
pelo "prima dona", tão adequado a Mega Ferreira. Mas também é certo que Berardo
tem dado provas de saber ser aconselhado, pelo menos no que diz respeito à sua
colecção. E isto é especialmente notável, sobretudo num país em que muitos dos que
têm dinheiro e poder ostentam saber do que não sabem, como se não existissem
especialistas e especializações.
Objecto > Marcel Duchamp (1887-1968), França/EUA
> Boîte (série C), Museu Colecção Berardo, Lisboa
[R]
Etiquetas: Marcel Duchamp, Museu Berardo, museus