quarta-feira, novembro 15, 2006

PROMETEU E PANDORA



Será que a crença na economia de mercado é portadora de felicidade e nos torna mais
livres? Ou será que os novos mitos do consumo apenas nos remetem para a condição
de consumidores consumidos? Será que os deuses dos antigos gregos fundadores da
nossa civilização continuam a punir-nos?

Segundo a mitologia grega, quando os deuses do Olimpo criaram a espécie humana
privaram-na do fogo, o elemento da inteligência. Porém, o titã Prometeu, afeiçoado
aos mortais, decidiu roubar o fogo que era atributo divino e entregá-lo à humanidade.
A ira de Zeus foi terrível: ordenou que Prometeu fosse enviado para a terra dos
homens e aí ficasse agrilhoado a uma coluna, de modo a que durante o dia o seu fígado
fosse devorado por uma águia e durante a noite se regenerasse, para ser devorado de
novo no dia seguinte, até à eternidade.



Mas Zeus, ainda não satisfeito, decidiu lançar uma maldição sobre a humanidade,
enviando à Terra uma mulher irresistível, a bela Pandora, para que entregasse a
Prometeu uma caixa repleta de todas as pragas: doenças, medo, ódio, tristeza,
loucura, e um sem número daqueles que viriam a ser os males da condição humana.
Prometeu, desconfiando da crueldade de Zeus, recusou a caixa e recomendou a
Pandora que não a abrisse. Curiosa, ela não resistiu e acabou por abri-la,
espalhando assim o sofrimento sobre a Terra. Porém, na sua fúria vingativa, Zeus
tinha deixado na caixa, por engano, a Esperança.
[Bolota]

Pintura > Pieter Paul Rubens (1577-1640), Bélgica (Flandres)
> Prometheus, 1611/1612, Col. Philadelphia Museum of Art, USA

Fotografia/Cinema > G. W. Pabst (1885-1967), Áustria/EUA
> Louise Brooks, in "Pandora's Box", 1929.
Adenda: v. Louise Brooks no Sub Rosa.
[R]

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10 Comentários:

Blogger RatherCynical escreveu...

A resposta para a felicidade não está na economia e os antigos deuses já não nos castigam mais. Zeus, ele próprio, da última vez que o vi estava fritando batatas num McDonald's e a única caixa que lhe resta fechar é a registradora; Prometeu, prometeu muito, mas não cumpriu e até mesmo Pandora, essa galdéria, arranjou um tacho na Caixa de Aposentações. À pobre águia é que o destino não poupou, agora domesticada, diverte ursos aos fins-de-semana num estádio de futebol.

15 novembro, 2006 14:43  
Anonymous Anónimo escreveu...

Então, Cynical??? Ânimo!Não fiques à espera que a Pandora vá ter contigo para te oferecer a esperança de bandeja. Tens de procurá-la...não nos estádios, nem no MacDonalds.

A não ser que já a tenhas visto e estivesse, também ela transformada em algo que não quiseste dizer.

Um abraço esperançoso e sem ponta de cinismo.

15 novembro, 2006 15:47  
Anonymous Anónimo escreveu...

Os deuses talvez já nem nos castiguem, devem estar fartos. E nem precisam de nos castigar: nós encarregamo-nos de o fazer, a nós próprios e uns aos outros, e o pior de tudo é que o fazemos em grande parte em nome da abundância (a que alguns chamam qualidade de vida).

Saúdo este primeiro post de Bolota, trazendo ao debate as nossas raízes civilizacionais e as alegorias da condição humana.

15 novembro, 2006 22:38  
Anonymous Anónimo escreveu...

Ocorreu-me também que na "sabedoria" popular portuguesa abundam os provérbios de índole ora pessimista, ora conformista, ora conservadora. Porque se diz que "as rosas caeam e os espinhos ficam" e quanto a isso não há muito que pensar, já que "a pensar morreu um burro" e muito menos que falar : sabemos que "calado é o melhor", "onde está galo não canta galinha". Embora se reconheça que este mundo está cheio de injustiças - ninguém negará que "dá Deus nozes a quem não tem dentes" e que "quando o mar bate na rocha, quem se lixa é o mexilhão"," também é certo que "manda quem pode, obedece quem deve" e sempre as coisas "ficarão como dantes, quartel- general em Abrantes". Também não vale a pena ter boas intenções, porque delas "está o inferno cheio" nem tentar aligeirar o humor face às desgraças, porque "com "coisas sérias não se brinca". Tentar fazer mais e melhor pode não ser boa ideia, porque "quanto mais se sobe, maior é a queda" e "quando um cai, todos o pisam". Para além de que "quem torto nasce tarde ou nunca se endireita"
Posto isto, não sei como surgiu "enquanto há vida há esperança".

17 novembro, 2006 12:47  
Anonymous Anónimo escreveu...

Parece que a Esperança ficou dentro da caixa de Pandora, talvez parcimoniosa a ver quem se lembrava dela. Não andamos muito dados a lembrá-la. Sinal dos tempos?

17 novembro, 2006 21:01  
Blogger paulo escreveu...

A economia de mercado, o capitalismo, são portadores de injustiça e alienação. A turba consome, procria e produz. São clientes, contribuintes, recursos humanos. Tudo no presente contínuo. O consumo é o prémio por bom comportamento. Pensar não é uma tarefa da turba. É até censurável. Inconsciência de si, mundo plano, vida dirigida: entes amestrados. Não há escravos nem proletários, nem sequer devotos de uma religião do dinheiro, apenas peças de uma engrenagem social que produzem de um lado para consumir do outro.
Vidas em meia pensão não têm deuses nem mitos outros que os que formam a cerca do redil mental em que existem. Como poderiam ter se acabou o passado, se não há origem, se as palavras perderam os étimos; de facto não há palavras só há marcas. Têm TV. Quando desligam a TV (a voz do dono) dormem. Se desligarem muito tempo perdem-se. Se nunca mais ligaram é porque morreram.
Talvez só a guerra, a fome, a morte e os outros males que saíram da caixa, ensinem um dia a partilhar a escassez. Talvez o gesto de Pandora não tenha sido um castigo. Ou talvez a esperança fosse também um castigo.

18 novembro, 2006 04:18  
Anonymous Anónimo escreveu...

Venho, encantada com a força unida à beleza do blogue, agradecer a a tenciosa referência ao Sub Rossa.
Um beijo a todos que o fazem!
Meg (Sub Rosa)

19 novembro, 2006 09:28  
Anonymous Anónimo escreveu...

Paulo:
Certamente Bolota dará resposta ao seu comentário. Da minha parte só tenho que agradecer o seu
contributo. E já agora, será que não devemos ter esperança numa alternativa à economia de mercado?

20 novembro, 2006 01:42  
Anonymous Anónimo escreveu...

Meg:
Gratos pelo comentário, respondemos-lhe deste lado do Atlântico com um post de Abril:

http://ultraperiferico.blogspot.com/2006/04/citao-1-da-minha-lngua-da-minha-lngua.html

20 novembro, 2006 01:47  
Blogger Aldina Duarte escreveu...

A esperança fruto dum engano divino é uma ideia brilhante!

Até sempre

24 novembro, 2006 12:35  

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