AMÁLIA
"A escuridão é o seu elemento, figura dominadora mesmo antes de
começar a cantar. Na semiobscuridade do palco, apenas a sua pálida
beleza luminosa, o seu rosto de maçãs salientes e boca generosamente
ampla aparecem à luz do projector. Quanto ao resto, um vestido de
noite negro, de pregas flutuantes, com mangas, que só não lhe esconde
as mãos. Não usa nem um anel, nem uma pulseira, nem uns brincos,
apenas um enorme alfinete de diamantes, colocado na cintura, que
cobre com a mão, quando canta. É a tragédia clássica esculpida na
Terra. Antígona depois de Tebas, Cassandra depois de Tróia.(...)
Amália não usa truques de voz ou movimentos para chamar a atenção.
Quando canta, permanece monumentalmente imóvel, embora a cabeça
possa erguer-se num lamento. "
> H.S., "Queen of Sorrows", in Newsweek, 10 de Fevereiro de 1969.
De Hollywood fui para Nova Iorque fazer outra temporada no La Vie En Rose (...).
Nessa altura não fiquei na América porque não quis. Gravei lá um disco de fado e
flamenco e até me abriram conta no banco para ficar mais tempo e gravar dois
albuns, com canções de Cole Porter, Gershwin, Jerome Kern. Eu cantava algumas
cantigas em inglês, Half As Much, I Love Paris e especialmente uma, que fazia muito
sucesso, Hi-Lili, Hi-Lo, a que eles achavam que eu dava uma mensagem, que dava
profundidade. Mais tarde gravei um disco em inglês e até acho que está bonito,
embora a voz esteja pouco valorizada. Mas levou vinte anos a sair porque eu não
me decidia. Cantei à minha maneira. Eu sei que não tenho nenhuma obrigação de
pronunciar bem o inglês. Os americanos também não cantam o fado como eu canto.
> in "Amalia - Uma biografia", ed. Presença, Lisboa, 2005
Dedicado a Amália, nascida a 1 de Julho 1920.
[P]
Fotografia > Thurston Hopkins (n.1913), Reino Unido
> Amália, Lisboa, déc. 1950 (col. Culturgest/CGD, Lisboa)
[R]
Voz > Amália Rodrigues (1920-1999), Portugal
Música > Lionel Bart (1930-1999), Reino Unido
> Who will buy, in "Amália na Broadway" (1965), ed. Valentim de Carvalho, 1985
[H]
"A escuridão é o seu elemento, figura dominadora mesmo antes de
começar a cantar. Na semiobscuridade do palco, apenas a sua pálida
beleza luminosa, o seu rosto de maçãs salientes e boca generosamente
ampla aparecem à luz do projector. Quanto ao resto, um vestido de
noite negro, de pregas flutuantes, com mangas, que só não lhe esconde
as mãos. Não usa nem um anel, nem uma pulseira, nem uns brincos,
apenas um enorme alfinete de diamantes, colocado na cintura, que
cobre com a mão, quando canta. É a tragédia clássica esculpida na
Terra. Antígona depois de Tebas, Cassandra depois de Tróia.(...)
Amália não usa truques de voz ou movimentos para chamar a atenção.
Quando canta, permanece monumentalmente imóvel, embora a cabeça
possa erguer-se num lamento. "
> H.S., "Queen of Sorrows", in Newsweek, 10 de Fevereiro de 1969.
De Hollywood fui para Nova Iorque fazer outra temporada no La Vie En Rose (...).
Nessa altura não fiquei na América porque não quis. Gravei lá um disco de fado e
flamenco e até me abriram conta no banco para ficar mais tempo e gravar dois
albuns, com canções de Cole Porter, Gershwin, Jerome Kern. Eu cantava algumas
cantigas em inglês, Half As Much, I Love Paris e especialmente uma, que fazia muito
sucesso, Hi-Lili, Hi-Lo, a que eles achavam que eu dava uma mensagem, que dava
profundidade. Mais tarde gravei um disco em inglês e até acho que está bonito,
embora a voz esteja pouco valorizada. Mas levou vinte anos a sair porque eu não
me decidia. Cantei à minha maneira. Eu sei que não tenho nenhuma obrigação de
pronunciar bem o inglês. Os americanos também não cantam o fado como eu canto.
> in "Amalia - Uma biografia", ed. Presença, Lisboa, 2005
Dedicado a Amália, nascida a 1 de Julho 1920.
[P]
Fotografia > Thurston Hopkins (n.1913), Reino Unido
> Amália, Lisboa, déc. 1950 (col. Culturgest/CGD, Lisboa)
[R]
Voz > Amália Rodrigues (1920-1999), Portugal
Música > Lionel Bart (1930-1999), Reino Unido
> Who will buy, in "Amália na Broadway" (1965), ed. Valentim de Carvalho, 1985
[H]
Etiquetas: Amália, Lionel Bart, música, Thurston Hopkins
16 Comentários:
Comovente. Marcante.
Muito tocante este post.
Não conhecia a Amália a cantar em inglês!
Porque razão aparece no site linkado no post que a data de nascimento é 23 de Julho de 1920?
Não me cabe responder, mas desconfio que 23 de Julho fosse a data de nascimento oficial. O mesmo acontece com meu pai e com minha mãe, assim como acontecia com milhões de portugueses, que trazem nos BI datas de nascimento que não correspondem ao dia exacto em que nasceram. Naquele tempo era assim... por várias razões, entre as quais a fuga a multas.
Obrigado a HMBF e a Mister pelos comentários. Quanto ao dia do nascimento de Amália, ela gostava de receber parabéns a 1 de Julho porque a avó, que a criou, não sabendo exactamente o dia em que a neta tinha nascido, lhe dizia: "tu nasceste no tempo das cerejas". Mas Amália também gostava de festejar os anos a 23 de Julho, porque lhe agradava a ideia de ser do signo Leão.
Obrigado pelos vossos comentários de esclarecimento, e parabens pelo post Propanolol.
Não deixa de ser surpreendente que num dia como o de hoje as televisões e os meios de comunicação social estejam mais preocupados com o concerto de homenagem à diana, que numa qualquer homenagem a um dos maiores icones da cultura portuguesa - para o bem e para o mal, é a nossa.
Por causa dessa história de Amália ter nascido "no tempo das cerejas", a que se refere Propranolol, sempre associei a cantora, com aquela alegria de menina grande, que ela tinha quando saía para o campo, a colocar brincos-de-cerejas nas orelhas. E que bem lhe ficava o encarnado.
Música lindíssima e uma maravilhosa homenagem a uma das vozes mais intensas e inesquecíveis de todos os tempos.
Também não conhecia Amália em inglês, resultado muito sui generis..
É daquelas vozes que entra no âmago e dá vontade de chorar.. a mim, dá-me sempre.
Obrigada por estes momentos tão intensos.
Que beleza, que intensidade, que saudades da Amália!
Isobel,
Obrigado pelo comentário. Amália gravou em inglês, mas também existem muitos registos em espanhol, francês, italiano, dialecto napolitano, português de Angola, português do Brasil, espanhol do México. Como fazia frequentes tournées no estrangeiro, desde a década de 40 até ao início da de 90, muitos dos registos foram captados em concerto, inclusivamente no Japão.
Obrigado, Rathercynical. Apesar de o país passar a vidinha entretido em polémicas à volta deste e daquele, o Ultraperiférico decidiu que desta vez não ia deixar passar a oportunidade de homenagear alguém que de polémicas portuguesas também não se livrou. Foi prontamente esquecida a partir de Outubro de 1999. Mas na verdade, pessoas como Amália apenas nascem e por isso o dia 1 e o dia 23 de Julho continuarão a ser dias para lembrá-la.
A fotografia consegue ter o que melhor tinha a Amália ... fantástica. Sempre chorei com «O Fado nasceu um dia ....» e sempre vi o bairro Alto com os olhos de um marinheiro gingão. Nunca tive medo que gostar da Amália quisesse dizer qualquer coisa mais do que cantar Lisboa e assim o Mundo!
Parabéns. Tal como a «Cidade das Mulheres» este é o blog que espreito sempre.Espero continuar a fazê-lo, porque me surpreende sempre
Mena:
Obrigado pelas palavras de estímulo. Também nós não temos medo de gostar de Amália. Oxalá tenha ouvido a voz dela na música que escolhemos para acompanhar a fotografia.
Abraço.
Com que voz...Como ela canta...
A nossa Amália. Muito obrigado,
José M. Rodrigues
É preciso coragem para sermos nós próprios, com tudo o que isso implica.
José M. Rodrigues,
As tuas palavras lembraram-me o que Caetano Veloso disse um dia em palco: "uma das coisas que mais marcaram a minha vida foi o som que saía e sai e sempre soará no mundo, da garganta de Amália Rodrigues".
Abraços.
Mário,
Como alguém disse: "todos somos responsáveis pelos nossos actos, como todos somos inocentes de nós próprios".
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